Rogério Lessa Benemond
Há bem pouco tempo, o campeonato estadual do Rio ficou tão desprestigiado que ganhou o apelido de Caixão. Algum esforço foi feito, com algum sucesso, para recuperar o prestígio da competição que já foi considerada “a mais charmosa do Brasil.” Este ano, no entanto, ao ver o capitão rubro-negro Fábio Luciano se jogar na área do Botafogo e, minutos depois, tentar fazer um gol de mão, tive a certeza que o Caixão estava de volta. Antes, me veio outra certeza: de que o próprio Fábio Luciano avaliava que o juiz favoreceu o Flamengo na final da Taça Guanabara de 2008, jogo que deixou o Botafogo marcado pelo “chororô” após um suposto pênalti que Fábio Luciano teria sofrido.
O tal chororô virou um massacre contra as crianças botafoguenses nas escolas, enquanto a atitude do então meia alvinegro Diguinho, que jogou uma camisa do Flamengo contra o juiz, dizendo “veste, você não é flamenguista?”, caiu no esquecimento. Sem aquela vitória, o Flamengo sequer chegaria à única finalíssima que venceu, com a bola rolando, nesses três últimos anos de decisões contra o Botafogo. O alvinegro, por sinal, se credenciaria para a final ao vencer a Taça Rio com 10 jogadores numa vitória sobre o Fluminense na qual seu melhor jogador naquela partida, Alessandro, que havia colocado uma bola no travessão e puxava os contra-ataques, foi inexplicavelmente expulso de campo.
Mais impressionante é que este ano Fábio Luciano estava se despedindo dos gramados. Em vez de ficar marcado melancolicamente por uma despedida patética, o zagueiro recebeu elogios rasgados da imprensa e dos próprios colegas, que dedicaram a “conquista” ao companheiro que se aposentava.
Mas a tristeza não ficou só por conta de Fábio Luciano. No primeiro jogo da final, o camisa 10 do Botafogo, Maicosuel, eleito o craque do campeonato, foi caçado em campo e o derradeiro tostão que tomou na coxa esquerda sem dúvida ajudou a afastá-lo do último e decisivo jogo. Antes, havia sido vítima de uma falta desclassificante do lateral esquerdo Juan, que não foi expulso e já tivera sido beneficiado por um pênalti duvidoso, que agora se percebe que jamais seria marcado se fosse favorável ao Botafogo – como aliás foram as faltas duvidosas sofridas por Léo Silva e pelo próprio Maicosuel, dentro da área, sem que o juiz agisse com o mesmo rigor.
O árbitro da primeira partida, por sinal, não coibiu o anti-jogo praticado pelo Flamengo. A não expulsão de Juan foi até criticada pela imprensa, mas ironicamente acabou servindo de biombo para as outras falhas do juiz e para a perseguição ao craque do campeonato, em diversos outros lances.
Mas, este “penta-tri” do Flamengo – que acabou sendo o “tri-vice” do Botafogo – não estaria completo sem o título de 2007, conquistado a partir da marcação de um impedimento inexistente do atacante Dodô, seguida da expulsão do craque, melhor batedor de pênaltis do Botafogo. De 2007 para cá já presenciei uns três ou quatro jogos, inclusive um do próprio Flamengo contra o Sport Recife no Maracanã, nos quais o jogador chuta a bola após o apito do juiz, não é advertido e o lance sequer é comentado por narradores e comentaristas.
Esses mesmos colegas, entre eles alguns que criticaram ferozmente a postura defensiva do Botafogo na final da Taça Rio deste ano, cuja vitória do Flamengo forjou mais dois jogos de grande audiência televisiva, sequer levantaram a hipótese de marmelada para gerar renda e Ibope. É algo que não se pode provar, mas basta rever o jogo para desconfiar dessa possibilidade.
Se isso ocorreu, foi um erro incomensurável da nova diretoria do Botafogo, tão empenhada em expor as “mazelas” de Bebeto de Freitas, mas que aparentemente não teve a visão histórica da importância do estadual deste ano para uma torcida que está abandonando um dos maiores clubes da história do futebol, conforme avaliação da Fifa.
Esse abandono da torcida não se deu apenas pelos sucessivos – e sucessivas – bandeirinhas e juízes, que, em grande maioria, continuam por aí a apitar, mas também pela omissão de dirigentes novos e antigos, que punem um Zé Roberto antes de partida decisiva contra o São Paulo, como ocorreu no campeonato brasileiro de 2007, quando o Botafogo era líder e tinha a melhor média de público, ou formam equipes sem garra, que deixam um River Plate, em péssima fase, virar o jogo com nove jogadores em campo, tirando uma vitória histórica do Botafogo e provocando sua eliminação na Sul-Americana.
Um dos resultados de tudo isso é que no campeonato brasileiro não há nenhum clube carioca apontado como favorito ao título, salvo alguma esperança na classificação do Fluminense-Unimed de Parreira e Fred para a Libertadores. Outra consequência: apesar do Flamengo ter “a maior torcida do mundo”, as emissoras de TV preferem transmitir para todo o Brasil a final do Paulistão.
Rogério Lessa Benemond é jornalista